CHUEK

Erros de português dão o que falar. No mundo virtual, a circunstância aparece no oportunismo de capturar esses pequenos deslizes. Descontraída a reportagem sobre keywords, no Valor.

Vá a ‘Maiami’ e traga um ‘home teacher’
Por Cibelle Bouças

Griselda Pereira trabalhou por anos com serviços gerais, mas ficou milionária ao acertar um jogo da Mega Sena. Tornou-se empresária e, com pouco tempo de folga, passou a comprar itens pela internet. Griselda acessa um site de buscas e inicia a pesquisa de vários produtos: um “edredoum”, um “home teacher”, um DVD dos “Smorfes” e uma passagem “aéria” para “Maiami”. Os resultados dessas buscas? Griselda comprou o seu edredom na Portcasa, o home theater, no Mercado Livre. As passagens para Miami ela adquiriu na Viajanet. E trocou o DVD de “Os Smurfs – O Filme” pelo serviço de vídeo sob demanda da Netmovies.

Griselda é um personagem fictício, mas os exemplos acima – de buscas na internet com erros de ortografia – são todos reais. Por pressa ou desconhecimento da língua portuguesa, boa parte das pesquisas tem erros de grafia. Os serviços de busca do Google, do Yahoo e da Microsoft (Bing) desconsideram os erros de acentuação, de tão comuns que eles se tornaram. A alta incidência de erros, no entanto, tem feito grandes empresas pagarem mais por palavras erradas nos leilões dos chamados links patrocinados – os anúncios pagos que aparecem com os resultados das pesquisas on-line.

Do total de palavras escolhidas pelas empresas para associar às suas marcas, 15% dos termos contêm algum erro, o que vai da troca de letras à pesquisa de expressões esdrúxulas, como “home teacher” ou “holmer theater”. O que o consumidor queria, claro, é um home theater.

“Muitos consumidores buscam o termo incorreto, mas compram. É preciso ver esse problema como oportunidade”, diz Igor Lima, gerente de negócios para o mercado imobiliário do Google.

A OLX, empresa de classificados gratuitos na internet, negocia permanentemente cerca de 1 milhão de palavras, incluindo termos errados. Rodrigo Ribeirão, diretor-presidente da OLX para Brasil e Portugal, diz que só as buscas por nomes de empresas com erro representam 13% do total. A escolha dos termos errados baseia-se em buscas feitas por usuários no site da OLX e em sugestões dos sites de busca. “É uma ação de tentativa e erro, com a qual fica mais fácil identificar quais os termos mais procurados.”

A Netmovies já achou casos como “relry potter” e “reyi port”, para Harry Potter, e “Chuek”, para Shrek

O caso mais emblemático de escolha acertada de um termo com erro é o da Tecnisa. A incorporadora compra em média 400 mil palavras nos serviços de buscas, sendo 60 mil com erros. A Tecnisa pagava R$ 0,05 por clique de usuário que pesquisasse “gravides” (gravidez) e clicasse no seu link patrocinado. Havia pouca demanda pela palavra, até que a Tecnisa vendeu um apartamento de R$ 380 mil a uma usuária que pesquisou o termo e se interessou pelo anúncio. O resultado foi uma corrida pela palavra, cujo preço subiu para R$ 4 por clique. Romeo Busarello, diretor de marketing da Tecnisa, diz que 40% das vendas da incorporadora são feitas na internet. Desse total, 60% começam em uma busca do Google. “Tenho que ser encontrado pelo consumidor, não importa como ele pesquisa”, diz o executivo.

Para a locadora Netmovies, descobrir o que o internauta pesquisa é às vezes uma missão quase impossível. Há erros em títulos, nomes de atores e de diretores. Claudia Quintella Woods, diretora de marketing da empresa, diz que metade das cerca de 1,2 milhão de palavras-chaves que negocia contém erros. Entre os casos mais estranhos estão “fime smanfer”, “smofes” e “esmorfes” para “Os Smurfs – O Filme”; “fimenes pornogrates” (filmes pornográficos); “fimes bruna sufixinha” (“Bruna Surfistinha”); “rereporte”, “relry potter” ou “Reyi port” (Harry Potter); “Chuek” (Shrek); “fimes com estives cegal” (filmes com o ator Steven Seagal). “É um desafio entender o que o internauta procura para oferecer o filme”, afirma.

Cristiana Braz, diretora de pós-vendas do Yahoo no Brasil – responsável também pela área de links patrocinados do Bing, da Microsoft -, afirma que os setores que mais compram palavras-chaves são os de imóveis, turismo, aéreo e de comércio eletrônico. Entre os que mais adquirem palavras com erros estão os de eletroeletrônicos, turismo e vídeos sob demanda.

O Mercado Livre negocia em média 12 milhões de termos. Desse total, 15% contêm erros. Os casos mais comuns são os de produtos com nomes em inglês, diz Helisson Lemos, diretor-geral da empresa. Na lista entram “blutuf” (para bluetooth), “aiped” (para iPad) e “ismartifone” (para smartphone).

Alex Todres, sócio-fundador da Viajanet, também observa um grande volume de pesquisas com erros na área de turismo, como “Maiami” e “Disnei”. Para cada grupo de 100 palavras-chaves que a Viajanet compra, 20 contêm erros. “A pressa e o desconhecimento da língua são as principais causas para esse cenário”, afirma Todres.